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COLUNA AGRIDOCE: VÍDEO SIGILOSO DE BOLSONARO COM MINISTROS PARECE OBRA DE REALISMO FANTÁSTICO

Ligações perigosas. Arte: Douglas Caputo
Douglas Caputo

Douglas Caputo*

Talvez você não se lembre, mas provavelmente passou o natal e o réveillon de 1988 para 1989 com uma questão angustiante, debatida em tom grave entre um brinde e outro: “Quem matou Odete Roitman?”

O assassinato da vilã interpretada por Beatriz Segall, na novela “Vale Tudo”, agendou a conversa até de quem não se dizia noveleiro. Uma ficção policial transformada em uma quase narrativa do real.

O reverso também é possível, quando o “real” é perpassado pelo romanesco. Afinal, o tal vídeo, da tal reunião ministerial, com o tal ex-ministro Sergio Moro (Justiça), no tal 22 de abril, ganhou tal feição folhetinesca.

A gravação, sob sigilo, parece o clímax das narrativas seriadas. Enquanto a ação cênica caminha morosamente para o desfecho, ficamos roendo as unhas. O mandatário Jair Bolsonaro (sem partido) teria mesmo ameaçado Moro no caso da Polícia Federal (PF)?   

Trama enrolada, desencontro de personagens em depoimentos policias, mocinhos, vilões. Podem até chamar a Regina Duarte, isso se ela não resolveu tirar umas férias depois de chiliques em entrevista na TV.

Até aquele personagem menor, que andava ofuscado pelas rupturas dentro de rupturas do governo, retornou à cena. Bastou uma tuitada e, zás, o vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, deus as caras no novelão.

Embora Bolsonaro afirme que o ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, “se equivocou” ao dizer que houve menção à PF durante a reunião ministerial, Mourão, no entanto, não endossa a fala do mandatário:

Dissonante. Reprodução: Twitter

Durante oitiva na última terça (12), o ministro Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) disse que, apesar de Bolsonaro não ter se dirigido diretamente a Moro na reunião ministerial, o mandatário teria demonstrado interesse no conteúdo de instituições de segurança.    

“Tendo também [Bolsonaro] reclamado da escassez de informações de inteligência que lhe eram repassadas para subsidiar suas decisões, fazendo decisões específicas sobre sua segurança pessoal, sobre a ABIN, sobre a PF e sobre o Ministério da Defesa”, afirmou Heleno.

A versão de Heleno foi confirmada pelo ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) durante depoimento também na terça. Segundo Ramos, Bolsonaro disse durante a reunião que “para melhorar a qualidade dos relatórios, na condição de presidente da República, iria interferir em todos os ministérios”.

Já o ministro Walter Braga Netto (Casa Civil) reforçou a versão de Bolsonaro e disse que não ouviu o mandatário mencionar interesse na troca de comando da PF. O depoimento de Braga Netto ocorreu no mesmo dia dos outros dois colegas. As informações sobre o conteúdo das oitivas são da Folha de S. Paulo.

“Fera Ferida”

Coronavírus é só figurante. Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Brasília ou Tubiacanga? Parece mesmo que o realismo fantástico tomou conta do Planalto. Ainda não apareceram alquimistas para transformar ossos em ouro, mas as investigações já fizeram o dólar disparar – e Bolsonaro também.   

Imediatamente às oitivas de terça passada, o mandatário abriu fogo-amigo contra seu exército. Em entrevista na quarta (13), ele voltou a afirmar que o vídeo não tem nada comprometedor e que as pessoas “vão cair do cavalo” com o conteúdo gravado.

“Eu não falo Polícia Federal. Não existem as palavras Polícia Federal em todo o vídeo. Não existe a palavra superintendência. Não existe a palavra investigação sobre filho. Falo sobre segurança da família e meus amigos. Ou você acha que não há interesse em fazer uma maldade com um filho meu?”, questionou Bolsonaro.

Quando foi mesmo que os Três Porquinhos entraram no enredo? Ah, sim! Todo o imbróglio teria sido motivado para se obter informações privilegiadas da PF sobre investigações que envolvem o clã Bolsonaro.

Mas, não se engane, essa historinha não é para o público infantil não. Tirem as crianças da sala! As cenas quentes do vídeo podem aparecer como num corte inesperado de câmera. O próprio mandatário já autorizou.

“Se eu não me engano, o Celso de Mello [STF] oficiou aí o advogado do Moro, a AGU e a Justiça exatamente para ver se a gente entra nessa linha para divulgar, mesmo com os palavrões que eu falo sempre”, Bolsonaro não se fez de rogado.

As cenas dos próximos capítulos prometem. Enquanto o ministro Celso de Mello decide sobre a publicidade do vídeo, a Procuradoria Geral da República pode denunciar Bolsonaro à Câmara, que decide sobre o prosseguimento das investigações.

Se prosseguir, o mandatário é afastado do cargo por 180 dias. Mas isso vai depender, majoritariamente, do Centrão. No toma lá, dá cá, tudo pode acontecer. Entre uma cena e outra ainda dá pra ver aquela outra novelinha, O super incidente em Antares, estrelada pelo coronavírus.

Redação Douglas
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*É jornalista, mestre em Letras e professor de redação no curso SOU1000.

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