Início Gerais Cotidiano SINDICALISTAS E EDUCADORES CRITICAM PRIVATIZAÇÃO DA GESTÃO DAS ESCOLAS

SINDICALISTAS E EDUCADORES CRITICAM PRIVATIZAÇÃO DA GESTÃO DAS ESCOLAS

Janaine, Maria Jaqueline, Aline Maia e Aline de Araújo comentam o projeto Somar. (Fotos: arquivo pessoal / Montagem: NG)

Wanderson Nascimento
Notícias Gerais

O projeto do Governo de Minas que prevê a privatização da gestão das escolas públicas do Estado, já em fase de testes em três escolas mineiras, não agradou sindicalistas, educadores, trabalhadores da educação e acadêmicos nem de Barbacena e nem de São João del-Rei.

Se na esfera política há polêmica quanto aos possíveis resultados, entre sindicalistas e especialistas, o diagnóstico é unânime: o projeto só interessará aos empresários da educação, que muito poderão lucrar com ele, em detrimento de professores e estudantes, que serão prejudicados.

Em matéria publicada na segunda (17), o Notícias Gerais explicou como funciona a iniciativa, batizado pelo Governo do Estado de Projeto Somar. Confira agora o que pensam os profissionais que pensam e vivem a educação:

Ao NG, Aline de Araújo sinaliza ser contrária o projeto. (Foto: arquivo)

Para a coordenadora-geral do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE) – subsede Barbacena, Aline Gizele de Araújo Salvador, o projeto “Somar” é a maneira pela qual o governo Zema tenta realizar a privatização do Ensino Médio em Minas Gerais.

Segundo ela, o projeto entrega esta parte da rede pública estadual para Organizações Sociais (OS), aliado ao ‘Mãos Dadas’, que é o projeto de municipalização dos anos iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano do 1º grau), que, segundo a professora, vem sendo iniciado sem a devida discussão com a comunidade escolar.

Ela visualiza que a iniciativa é a demonstração do descaso da Educação em Minas Gerais, pois, em vez de investir em acessibilidade à comunidade escolar e tecnologia aos servidores para a realização de suas funções, relega sua responsabilidade num misto de omissão e entreguismo.

“Somos totalmente contra os projetos. Somos totalmente contra estes verdadeiros ataques à Educação de Minas Gerais”

Aline Gizele de Araújo Salvador, SindUte Barbacena

Aline Maia Silva, que representa o Sind-UTE de Barbacena na Frente Popular pelos Direitos, entende que o projeto “Somar” representa mais um passo no processo de privatização da educação pública, e isso significa – a médio prazo – o fim da educação pública.

“Ao transferir parte dos recursos públicos para a iniciativa privada, o governo de Minas vai abrindo espaço para que esses interesses privados que, por mais bem intencionados que pareçam, visam, em última instância, o lucro”, cita. Ela também afirma que há muitas questões em aberto.

Aline Maia também é contra o projeto Somar. (Foto: arquivo pessoal)

“Quando, por algum motivo circunstancial, uma escola gerida pela iniciativa privada parar de gerar lucro, o que será feito com o processo de ensino, com a escola? Será fechada? E se assim for, quem assume os custos?”, indaga, destacando que, no fim das contas, em uma situação dessas, que não é difícil de acontecer, o estado acaba pagando duplamente.

Aline ainda aponta outro problema: a ideia difundida de que a simples mudança de gestão (do público para o privado) melhora a qualidade da educação, em um passe de mágica. “Como se o setor privado soubesse enfrentar os problemas que se dão na esfera pública, que são de natureza diferente”, complementa.

“Temos problemas antigos na educação pública, que passam pela valorização dos trabalhadores da educação, instrumentalização e estruturação dos espaços educacionais, investimento em formação continuada, entre várias outras coisas. Mudar a gestão não resolve essas questões e, no caso da gestão privada, ainda podem maquiar a resolução desses problemas atrás da lógica simplista de se cumprir ‘metas educacionais”

Aline Maia Silva, Frente Popular pelos Direitos
Mestra e doutora em Educação, Maria Jaqueline também é contra o projeto. (Foto: arquivo)

Maria Jaqueline de Grammont é pedagoga, professa da UFSJ e presidenta Seção Sindical dos Docentes da UFSJ (ADUFSJ – Seção Sindical). Ela defende que o projeto “Somar” é parte do projeto do estado para privatização dos serviços públicos, que está sendo colocado pelas políticas neoliberais, e parte de premissas falsas em relação a diferenças entre público e privado.

No caso da educação, desconsidera os professores como profissionais capazes de gerir, organizar e fazer acontecer a educação, principalmente para as camadas sociais mais pobres.

“ESSAS FALSAS PREMISSAS COLOCAM PRIMEIRO QUE ‘TUDO QUE É PÚBLICO É MAL GERENCIADO’, E ‘TUDO QUE É PRIVADO É BEM GERENCIADO, E ISSO NÃO É VERDADE’. O QUE TEMOS É UM SERVIÇO PÚBLICO SUBORDINADO AOS INTERESSES DOS CONGLOMERADOS PRIVADOS. ISSO É HISTÓRICO EM NOSSO PAÍS”

Maria Jaqueline de Grammont, professora da UFSJ e presidenta da ADUFSJ.

De acordo com Grammont, os serviços públicos em educação no Brasil estão sendo disputados por um grande número de instituições de grande porte, que enxergam na educação “um grande filão financeiro”, que querem ganhar dinheiro com ela.

E ainda há a visão política, conforme lembrado pela professora: o movimento é de não dar oportunidade para grupos menores, para que eles possam continuar exercendo atividades sem especialização, sem salário, em situação de semi-escravidão.

“O projeto Somar vai separar o administrativo do pedagógico, e isso é uma discussão superada dentro da pedagogia. Quem conhece os alunos e a comunidade, que são os professores que lidam com eles diariamente, é que têm muito mais condições de gerenciar essas escolas, não só pela formação específica, mas também pelo conhecimento da realidade dessas comunidades”, destaca.

A pedagoga ainda aponta a contradição da proposta em relação ao custo – uma vez que as maiores deficiências do ensino decorrem justamente do baixo investimento. Mas a proposta do projeto vai culminar com um maior custo para o estado – sem, contanto, se refletir na educação, mas na geração de lucro para as instituições privadas.

“Uma empresa privada não entra num processo social se não for para ter lucro, ou abatimento em imposto de renda, ou ainda para retirar alguma vantagem”, afirma. Ela defende não há nenhuma vantagem na implantação desse projeto – seja na parte administrativa, seja no campo pedagógico, bem como no político.

“Esse projeto é para acabar com a excelência das escolas de ensino médio, que foi provada pelos institutos federais, que, com recursos, bom plano de carreira, investimento maciço e apoio político dentro do MEC e do governo, possibilitaram que grande número dos jovens das classes populares pudessem chegar às universidades, sem passar pelo ensino privado”, conclui.

Para Janaíne, o governo do Estado tem transferido, cada vez mais sua responsabilidade pela Educação. (Foto: reprodução)

Janaíne Ferreira, coordenadora da subsede do Sind-UTE de São João del-Rei e Região, argumenta que o governo do estado se esconde por trás da proposta de melhorar o desempenho das escolas para aplicar a privatização do ensino, responsabilizando os profissionais da educação pelo baixo rendimento de algumas delas, como se a evasão escolar e a qualidade do ensino estivessem condicionadas apenas ao trabalho realizado em sala de aula.

“A qualidade da educação está condicionada também às condições de acesso e permanência na escola. A evasão escolar está mais atrelada a fatores externos, sociais e econômicos, do que internos. Os estudantes precisam ter condições de permanecer nas escolas”, explica.

Além de buscar alternativas para privatizar, complementa Janaíne, o Governo de Minas tem interesse de municipalizar, entregando o ensino fundamental para as prefeituras. “Pela Lei de Diretrizes e Bases, o ensino fundamental é de responsabilidade dos municípios, mas tem que ser levado em consideração que muitos deles não têm recursos e condições para assumir essa responsabilidade”, relembra.

Concordando com Maria Jaqueline, Janaíne também enxerga a contradição do governo em relação aos custos: uma vez que o projeto “Somar” prevê um investimento anual por aluno de R$ 4.927,00, enquanto para as demais escolas, hoje é previsto uma valor de R$ 3.510,00.

“Se o estado deseja melhorar mesmo o rendimento das escolas, por que propõe um projeto em que vai investir mais recursos em uma gestão privada, e, para o restante da rede pública, os recursos são menores?”, questiona.

Outro ponto que Janaíne apresenta é quanto a gestão democrática, que é prevista na Constituição Federal e na LDB. No caso do projeto “Somar”, a comunidade escolar fica privada de exercer esse direito de participação e decisão dentro da escola.

Além disso, os trabalhadores que estão lotados nessas instituições onde será implantado o projeto serão remanejados para outras unidades escolares, e os diretores, vice-diretores e secretários escolares serão escolhidos por essas instituições que vão gerir as escolas.

“O processo de gestão democrática dentro da escola pública será totalmente eliminado, e entendemos que a educação é um bem de interesse coletivo e social”, comenta.

Janaíne também assinala que a forma pela qual foi implantado o projeto é desrespeitosa com os profissionais da educação, pois se propõe uma mudança de proposta pedagógica no meio do ano letivo, com os profissionais tomando conhecimento por meio da imprensa e com a proposta para a mudança já no segundo semestre.

“O governo de Minas está entregando, nas mãos da iniciativa privada, a educação pública. A rede estadual, os trabalhadores da educação, a escola pública, estão muito ameaçadas nesses sentido. O governo toma medidas maldosas para que o estado não tenha mais o controle da educação em Minas Gerais”

Janaíne Ferreira, SindUte São João del-Rei

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