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EX-REITOR DA UFSJ, SÉRGIO CERQUEIRA FAZ UM BALANÇO DA INSTITUIÇÃO DOS TEMPOS DE DILMA AOS DE BOLSONARO

André Frigo
Notícias Gerais

Sérgio Cerqueira, o Serjão, encerrou seu mandado na reitoria da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ) na última segunda-feira (4), após um parecer jurídico inusitado do Ministério da Educação (MEC), que determinou que o mandado do reitor termina no dia da sua nomeação e não mais no dia da sua posse, como era o entendimento anterior. Pelas normas anteriores seu mandado terminaria nesse sábado (9).

Serjão é engenheiro mecânico, com mestrado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e doutorado pela Universidade Estadual de Campinas. Além disso foi presidente da Comissão de Orçamento da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais (Andifes), foi membro de todos os Conselhos Superiores da UFSJ e vice-reitor no período 2012-2016.

Foi eleito em 2016 para a reitoria, função da qual se despediu nessa semana. Nesta sexta-feira (8), já sem o peso do cargo de reitor nos ombros, Sérgio conversou com o Notícias Gerais (NG) sobre os oito anos que esteve na reitoria, como vice e como reitor.

Avaliação do tempo na reitoria

Serjão divide sua atuação na reitoria em dois períodos. O primeiro, como vice da ex-reitora Valéria Kemp, ele considerou muito agradável. Segundo ele, foi a época do Reuni, o programa de reestruturação e expansão do ensino superior, lançado pelo governo Lula. “Foi o período de um investimento fantástico, de um governo que preocupava quando a universidade não conseguia executar seu orçamento, de um governo que bastava ter um projeto bem concebido para conseguisse os recursos necessários para executar. E que foi muito agradável, foi muito bom, uma situação maravilhosa, de estar construindo ainda uma universidade, com cursos novos sendo implementados. Desse primeiro mandato tenho uma saudade enorme dele”, relembra.

O segundo período, que é o do mandato de reitor, começa sob o signo do impeachment da presidenta Dilma. Serjão toma posse do cargo no dia 9 de maio de 2016 e Dilma é afastada da presidência no dia 12. A mudança de atitude do governo Temer em relação às universidades é sentida imediatamente. “Era um governo que se estranhava um pouco com o incremento das despesas. Nós vivemos algumas dificuldades, no primeiro ano, em especial, ele começa com bloqueios orçamentários, anúncios de cortes. O governo deixa de se preocupar tanto com as realizações na área da educação e busca um equilíbrio nas contas públicas”, analisa.

A posse de Jair Bolsonaro vai agravar as crises nas e com as universidades. Além dos cortes orçamentários cada vez mais rigorosos, as instituições federais passam a ser alvo de ataques. “Não houve um ano durante este mandato que a gente não tivesse que conviver com cortes, com um orçamento que era declinante em termos reais. Por vezes ele sofria algum reajuste, mas sempre inferior à inflação. E, principalmente, [tivemos que conviver] com uma situação de instabilidade. Aconteceu do orçamento ser liberado apenas em dezembro, quando o Ministério verificou a impossibilidade de algumas universidades pagarem as contas básicas”, denuncia

“Não houve um ano durante este mandato que a gente não tivesse que conviver com cortes, com um orçamento que era declinante em termos reais. Por vezes ele sofria algum reajuste, mas sempre inferior à inflação. E, principalmente, [tivemos que conviver] com uma situação de instabilidade”

Contraste entre crise externa e desempenho interno

Serjão chama a atenção para as realizações da UFSJ, apesar de todas as dificuldades que ela enfrentou nesses quatro anos. A falta de recursos não foi empecilho para o crescimento da produção acadêmica. “A universidade, mesmo nesse período difícil de recursos, nunca parou de crescer em termos de produção. Os artigos publicados pelos nossos professores aumentaram dramaticamente em número. E você percebe um aumento da qualidade das publicações, das vezes que elas são citadas. A gente tem um contraste gigantesco entre as dificuldades impostas por um governo e uma universidade que nunca desistiu, que continua trabalhando e produzindo cada vez mais ao longo desses anos”, ressalta.

“A gente tem um contraste gigantesco entre as dificuldades impostas por um governo e uma universidade que nunca desistiu, que continua trabalhando e produzindo cada vez mais ao longo desses anos”

Sobre a tentativa frustada de reeleição

Cerqueira encontra dificuldade de encontrar o motivo ou os motivos que fizeram com que ele não conseguisse ser reconduzido para mais quatros anos à frente da reitoria da UFSJ. Entre outros, Serjão citou a tradição política da UFSJ, que vem desde os tempos da antiga Funrei, onde grupos políticos com visões distintas da forma de construir e conduzir a universidade, por vezes, se unem para disputar a reitoria.

Por isso a harmonia entre esses grupos é fundamental. Apesar de Sérgio e Valéria serem de origens políticas distintas, eles encontraram um ponto de convivência harmoniosa. Entretanto, o mesmo não se deu entre ele e seu vice, Marcelo Pereira, o novo reitor da UFSJ. “O meu vice era de um grupo político diferente do meu, de uma outra origem política, de um outro departamento. Aconteceu que nós não conseguimos, ao longo da nossa gestão, estabelecer o mesmo nível de relação que eu e Valéria havíamos conseguido durante o seu mandato. Chegou um determinado do ponto do nosso mandato que eu e Marcelo não conseguimos compatibilizar visões e isso gerou uma divisão na nossa reitoria e culminou com a saída do Marcelo no início de 2018”, afirma.

A divisão dos grupos ficou evidente durante a disputa da consulta informal para reitor, em novembro de 2019, além desse pleito acontecer em um momento de grave crise financeira da universidade. Serjão aponta o desgaste de estar à frente da universidade nessa hora. “Então, quando disputamos a reeleição, grupos que estavam juntos, estavam separados. E eu tive que assumir, é claro, um período bem difícil. Eu tinha a obrigação de dizer não, muitos nãos. Eu tive que explicar para as pessoas que os recursos haviam minguado e que a universidade não tinha mais condição. Acho que isso faz parte da problemática que me levou a não reeleger”, avalia.

“Chegou um determinado do ponto do nosso mandato que eu e Marcelo não conseguimos compatibilizar visões e isso gerou uma divisão na nossa reitoria e culminou com a saída do Marcelo no início de 2018”

 Comunicação com a comunidade acadêmica

Quando questionado se houve falha na comunicação entre a reitoria e o restante da comunidade acadêmica, Sérgio admite que houve um desencontro entre o esforço de manter a universidade funcionando e fazer com que as pessoas tivessem a percepção disso. “Eu paguei o preço por não saber dizer aos outros o tamanho da crise que nós estávamos passando e o quanto nós tínhamos tido que trabalhar para que essa crise não chegasse na ponta. Eu tenho orgulho de ter feito, de ter conseguido administrar a universidade nesse momento de crise, sem que o aluno tivesse que ver a universidade sem a limpeza, sem a vigilância, a universidade sem o seu colaborador terceirizado. Foi uma questão de reestruturar gastos da universidade”, argumenta.

Avaliação do atual governo

Sem o peso e a responsabilidade de falar em nome da UFSJ, como quando era reitor, Sérgio faz uma avaliação crua do atual governo e da atuação do MEC. “Agora que não sou mais reitor, posso falar o que penso do atual governo. É um governo que não tem o menor compromisso com a educação, a menor vontade de dialogar com as universidades. Esse é um governo que não tem a menor boa relação com a universidade”, afirma.

Quanto ao ministro da EducaçãoAbraham Weintraub, Serjão aumenta o tom das críticas, realçando o lado arbitrário do mandatário. “O ministro constantemente constrangia os reitores.  É um ministro que nos expõe o tempo todo. Eu não fui até o ministro dialogar. Nós, reitores das universidades mineiras, fizemos um acordo de só irmos em conjunto ao ministro. Dado o clima que vinha sendo os encontros dos reitores com esse atual governo. O investimento em extensão e em pesquisa, para ele não existe. Para ele só existe o ensino para a graduação”, revela.

Cerqueira continua sua avaliação crítica de Weintraub, realçando a faceta do ministro que sempre transparece na mídia. “O ministro é um ser a parte. Ele não representa a totalidade do MEC. Lá dentro existem pessoas muito mais competentes, sérias, respeitosas. Porque eu acho que o pior desse ministro, do ponto de vista de quem trabalha, é o completo desrespeito, a forma acintosa pela qual ele se relaciona conosco. Outro dia se dirigiu a nós reitores, não da forma de praxe que é oficio circular, mas através de um twitter”, exemplifica.

“Agora que não sou mais reitor, posso falar o que penso do atual governo. É um governo que não tem o menor compromisso com a educação, a menor vontade de dialogar com as universidades. Esse é um governo que não tem a menor boa relação com a universidade”

Sobre a posse do novo reitor

A forma como aconteceu o processo de nomeação de Marcelo Pereira para a reitoria da UFSJ, no quadriênio que se inaugura nesse 8 de maio de 2020, foi condenado por Serjão. “Para mim é inusitado. Para mim o próprio Ministério não percebeu a bobagem que ele tinha feito. Emitiram um parecer que me fez sair antes da hora e não tinham pronta a indicação. Porque ele também contava com minha saída a partir do dia 9”, avalia. 

Sérgio destacou a importância do respeito à consulta informal para reitor e à lista tríplice elaborada após votação no Colégio Eleitoral.  “Acho que é necessário respeitar a democracia na universidade. Pena que aconteça dessa forma e não numa salutar transição. Quer dizer, a montagem da equipe nova que entra no lugar da equipe que sai e que durante duas ou três semanas tem a oportunidade de dialogar, passar o serviço, falar das dificuldades, de dizer aquilo que o governo tem nos pedido. Porque é um governo que nos pede muito e entrega pouco”, observa.

Planos para a vida pós reitoria

Encerrada essa fase de sua vida, Sérgio já estabeleceu os planos. Sua principal meta é voltar para a academia e voltar a dar aulas na área de máquinas térmicas, na qual fez doutorado, cadeira da qual está afastado desde 1995. “Agora na reta final recebi um convite do departamento de Ciências Térmicas e dos Fluidos e me removi para lá. Então eu volto para a sala de aula, mas volto em outro departamento, com outros colegas. Estou animado, tenho planos de fazer um pós-doc, é um período para recuperar. Esse departamento está trabalhando uma proposta de criar um curso de engenharia da energia dentro da UFSJ. Eu estou indo lá para colaborar nessa proposta”, comenta.

“Tenho certeza que vou sentir saudades das pessoas com quem convivi. Eu tinha uma equipe fabulosa para trabalhar ao longo desses oito anos. Teve gente que eu não conhecia, teve gente que eu tinha conhecido como adversário político e que veio trabalhar com a gente e hoje é nosso amigo. Eu vou sentir saudades do convívio direto com essas pessoas. Mas eu não fiz concurso para reitor, eu fiz concurso para professor. Então volto para a sala de aula com a maior alegria”.

“Tenho certeza que vou sentir saudades das pessoas com quem convivi. (…) Mas eu não fiz concurso para reitor, eu fiz concurso para professor. Então volto para a sala de aula com a maior alegria”.

1 COMENTÁRIO

  1. Esse governo atual merece muuuitas críticas, mas passar pano pro governo da Dilma que foi responsável por jogar o país na pior recessão de todos os tempos, só mostra o caráter desse reitor que está mais preocupado com sua posição política do que administrar uma universidade. Nota 0 pro Sergião e ainda bem que a UFSJ está livre dele.

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