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“A MULHER QUE SOFRE VIOLÊNCIA DEVE PROCURAR A DELEGACIA, NÃO AS REDES SOCIAIS”, DIZ JUÍZA

Foto: Arquivo pessoal

Najla Passos
Notícias Gerais

“Exposed, não faça!”, quem alerta é a titular da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Paranoá (DF), Ana Luíza Morato – uma juíza irreverente, que não teme se indispor com a academia e até mesmo com as feministas para defender políticas mais efetivas de enfrentamento à violência contra a mulher.

“Abuso sexual é crime, mas fazer acusação de fatos tão graves, somente em rede social, sem o devido registro na delegacia e outras providências legais, também pode ser crime. Quando a mulher sofre um abuso ou qualquer outra violência, o recomendado é procurar a delegacia, e não as redes sociais”, afirma.

Segundo ela, a exposição de quem faz a denúncia e a de quem é acusado não resolve a questão efetiva da violência, e ainda pode trazer consequências penais para a mulher. “De vítima a mulher passa a ser ré, acusada, e ainda repreendida. É o que está acontecendo com várias meninas em algumas cidades, como é o caso de Barbacena”, ressalta.

“De vítima a mulher passa a ser ré, acusada, e ainda repreendida. É o que está acontecendo com várias meninas em algumas cidades, como é o caso de Barbacena”

Segredo de justiça

A juíza lembra que crimes que envolvem violação à dignidade sexual tramitam em segredo de justiça, justamente para preservar a imagem dos envolvidos, até que os fatos sejam suficientemente esclarecidos. E acrescenta que, após a aprovação do Pacote Anticrime, legado do ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, a pessos acuadas em processos penais não podem ser expostas na internet.

“O EmPENHE-se faz esse alerta porque compreende que há uma equivocada percepção do movimento feminista nas redes sociais, e isso só enfraquece o trabalho de quem atua no combate à violência contra a mulher”, alerta ela nas redes sociais do projeto social que criou, em parceria com a pesquisadora Cláudia Mota, para despertar o protagonismo da mulher na prevenção e no combate à violência.

O que é o EmPENHE-se?

Segundo Ana Luíza Morato, o EmPENHE-se busca, desde o nome, recuperar o legado de coragem da Maria da Penha, a mulher que lutou por quase 20 anos contra a violência praticada pelo marido e acabou dando nome à lei que ampara as mulheres que passam por problemas semelhantes.

Com a experiência de observação do comportamento da mulher em situação de violência em mais de 2 mil audiências realizadas no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Paranoá-DF, ela afirma que a mulher não pode simplesmente ser  taxada como vítima, como o faz a legislação, as políticas públicas e mesmo alguns grupos feministas.

“A mulher, por falta de informação adequada, não percebe a necessidade de desenvolver um processo emocional de superação da relação abusiva, associando a solução do trauma da experiência da violência apenas ao processo judicial, iniciado na delegacia”, explica ela.

Para a juíza, a mulher precisa ser encorajada a atuar como protagonista, e não ser tratada como vítima. “Vivemos tempos de retrocessos sociais enormes, em que somos tratadas de forma inferiorizadas. Se nós, mulheres, continuarmos aceitando ser tratadas como eternas vítimas, daqui a pouco estaremos sendo tuteladas”, alerta.

“Vivemos tempos de retrocessos sociais enormes, em que somos tratadas de forma inferiorizadas. Se nós, mulheres, continuarmos aceitando ser tratadas como eternas vítimas, daqui a pouco estaremos sendo tuteladas”

Superação emocional

Para a juíza, se a mulher não se conscientizar de que é peça chave para a superação da violência, o Estado vai acabar falhando. “A maioria das denúncias são sobre fatos que ocorreram dentro do lar, onde muitas vezes a mulher é a única testemunha. Se ela não tiver força e coragem para denunciar o agressor, não há o que o Estado possa fazer”, destaca.

Segundo ela, mesmo que a legislação tenha mudado, não mais permitindo a desistência do processo de investigação na Delegacia, é preciso que ela colabore na audiência, prestando depoimento firme e seguro sobre os fatos. Se ela voltar atrás, a sentença dificilmente será a esperada. “A mulher não pode mais retirar a ‘queixa’ para favorecer o companheiro. Mas pode se negar a denunciá-lo na audiência judicial, o que, na prática, é desistir do processo”, explica.

“A mulher não pode mais retirar a ‘queixa’ para favorecer o companheiro. Mas pode se negar a denunciá-lo na audiência judicial, o que, na prática, é desistir do processo”

Como exemplo da necessidade do protagonismo da mulher, ela cita o caso do padrasto que violentou a enteada adolescente. Entretanto, na hora da audiência, já em fase de lua de mel com o companheiro, a mãe, principal testemunha do caso, se negou a confirmar o relato inicial feito na delegacia. “Eu fui obrigada a absolvê-lo por insuficiência de provas. E aquilo me deixou arrasada, porque a reincidência, nestes casos, é altíssima”, desabafa.

Por outro lado, Ana Luiza afirma que, quando a mulher assume o compromisso de exercer o protagonismo na ação penal, os resultados são muito diferentes. “Nós conseguimos inúmeras condenações só com a palavra da mulher que não hesita em manter a denúncia”, ressalta.

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